• Projeto: 2003
  •  Giovanni Drogo montado no cavalo já cansado no terceiro dia de jornada pelo caminho deserto e pedregoso avançava no caminho seco e vazio que serpenteava entre as escarpas pedregosas das últimas montanhas antes do chamado Deserto dos Tártaros, uma planície sem fim que estendia-se para o oriente para muito além do horizonte reto e vazio.

    Ansioso por chegar, Drogo impulsionou o cavalo. A um carroceiro que passava ele perguntou quanto tempo faltava para chegar ao Forte.

    —O forte? —respondeu o homem —Que forte? Por essas bandas não existem fortes —disse o carroceiro.

    Drogo retomou o caminho, sentindo uma sutil inquietude apoderar-se dele à medida que o sol avançava e as sombras do crepúsculo tomavam a tarde. Perscrutava os contornos altíssimos do vale para descobrir o Forte.

    Imaginava uma espécie de antigo castelo com muralhas vertiginosas. De repente, quando as últimas luzes já anunciavam a chegada da noite, percebeu, diante de si, negra e gigantesca contra o puríssimo céu violeta, uma construção militar que parecia antiga e deserta. Aquele devia ser o Forte; mas tudo, das muralhas à paisagem, transpirava um ar inóspito e sinistro.

    Da sombra acumulada aos pés da muralha surgiu então um homem velho, espécie de vagabundo e mendigo, com uma barba grisalha e um pequeno saco na mão.

    —O que está procurando, senhor? —perguntou.

    —Procuro o Forte. É este?

    —Não existe forte aqui —disse o desconhecido, com voz afável. —Está tudo terminado, já há muitos anos não há ninguém.

    —E onde fica o Forte então? —perguntou Drogo repentinamente irritado com aquele homem.

    —Que forte? Aquele talvez? —e o desconhecido estendeu um braço indicando alguma coisa.

    Numa fenda dos penhascos vizinhos, já encoberto pela escuridão, no fim de uma íngreme escadaria incrustada entre as rochas do penhasco, a uma distância incalculável, imerso ainda no sol vermelho do poente, Giovanni Drogo avistou um traçado regular e geométrico, de uma singular cor amarelada: o perfil do Forte.

    Oh, tão longe ainda. Que segredos ocultaria uma construção tão inacessível e solitária? Parecia-lhe o Forte um mundo desconhecido, de rigor absoluto cristalizado em geométricas leis. O derradeiro raio de sol descia e acima dos torreões amarelos irrompiam as lívidas rajadas da noite nascente. Um vago sorriso, ao mesmo tempo de alegria e tristeza, iluminava lentamente o rosto de Drogo, que parecia adivinhar o que estava/estaria por vir.

    [Recriação de trechos de ‘O Deserto dos Tártaros’, de Dino Buzatti]